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Ensaio sobre a lucidez
Romance, 2004

Edição brasileira de Ensaio sobre a lucidez.
Capa de Hélio de Almeida sobre relevo de Arthur Luiz Piza




























Numa manhã de votação que parecia como todas as outras, na capital de um país imaginário, os funcionários de uma das seções eleitorais se deparam com um situação insólita, que mais tarde, durante as apurações, se confirmaria de maneira espantosa. Aquele não seria um pleito como tantos outros, com a tradicional divisão de votos entre os partidos "da direita", "do centro" e "da esquerda"; o que se verifica é uma opção radical pelo voto em branco. Usando o símbolo máximo da democracia - o voto -, os eleitores parecem questionar profundamente o sistema de sucessão governamental em seu país.

É desse "corte de energia cívica" que fala Ensaio sobre a lucidez. Não apenas no título José Saramago se remete ao seu célebre Ensaio sobre a cegueira: também na trama ele retoma personagens e situações, insistindo em algumas das questões éticas e políticas abordadas no romance de 1995. Ao narrar as providências de governo, polícia e imprensa para entender as razões da "epidemia branca" - ações estas que levam rapidamente a um devaneio autoritário -, o autor faz uma alegoria do sistema político e das instituições que nos governam. A lucidez, aqui, é aquilo que se opõe à loucura, ao desvario, à demência; não se trata, portanto, de uma mera metáfora ou ironia.

O que se propõe não é a substituição da democracia por um sistema alternativo, mas o seu permanente questionamento. É pela via da ficção que José Saramago entrevê uma saída para esse impasse - pois é a potência simbólica da literatura, território em que reflexão, humor, arte  e política se entrosam, que por fim se revela capaz de vencer a mediocridade, a ignorância e o medo.

[Orelha da edição brasileira, publicada pela Companhia das Letras, 2006]