Passo num gesto que eu sei

+A +/- -A
Passo num gesto que eu sei
Deste mundo agoniado para o espaço
Onde sou quanto serei
No tempo que sobra escasso

No outro mundo sou rei
E o meu rosto de cristal e puro aço
É o espelho que forjei
Com suor pena e cansaço

E se o mundo que deixei
Tem as marcas desenhadas do meu passo
São baralhas que enredei
São teias e vidro baço

Tantas provas cá terei
Tantas vezes do pescoço solto o laço
Se me sagraram em rei
Aceitem a lei que eu faço

Vem a ser que o homem novo
Está na verdade que movo



_________
SARAMAGO, José. Provavelmente Alegria. 3a. ed. Lisboa: Caminho, 1987.