Labirinto

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Em mim te perco, aparição nocturna,
Neste bosque de enganos, nesta ausência,
Na cinza nevoenta da distância,
No longo corredor de portas falsas.

De tudo se faz nada, e esse nada
De um corpo vivo logo se povoa,
Como as ilhas do sonho que flutuam,
Brumosas, na memória regressada.

Em mim te perco, digo, quando a noite
Vem sobre a boca colocar o selo
Do enigma que, dito, ressuscita
E se envolve nos fumos do segredo.

Nas voltas e revoltas que me ensombram,
No cego tactear de olhos abertos,
Qual é do labirinto a porta máxima,
Onde a réstia de sol, os passos certos?

Em mim te perco, insisto, em mim te fujo,
Em mim cristais se fundem, se estilhaçam,
Mas quando o corpo quebra de cansado
Em ti me venço e salvo, me encontro em ti.



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SARAMAGO, José. Os poemas possíveis. 3a. ed. Lisboa: Caminho, 1981.