Neste bem organizado volume, Fernando Venâncio reúne uma dúzia de textos críticos, de dimensão desigual, publicados previamente na imprensa, tendo em comum a obra de Saramago. Como crítico literário, é sobejamente conhecido nas páginas de algumas publicações (Expresso, Jornal de Letras ou a revista Ler). Os seus interesses estendem-se à escrita de ficção, ao ensaio académico, à crónica e à tradução.
A obra inicia-se com um breve texto onde se justifica a reunião destes trabalhos críticos, apresentados como fonte de sentimentos díspares: "Contra uma concepção asséptica dos estudos literários, aceito que a literatura é uma fonte de prazeres e uma fonte de constrangimentos. A minha leitura de José Saramago foi até hoje, e talvez deva continuar a ser, ocasião de desencontradas sensações". Sem subterfúgios e com uma certa dose de coragem, está patente o espírito que anima os vários textos: salientar claramente as qualidades de um consagrado escritor contemporâneo; mas, quando é caso disso, censurar frontalmente debilidades e salientar aspectos menos conseguidos. É neste jogo de claro-escuro, de prazer e frustração, que assenta o presente acto crítico. Sem se deixar arrastar por perigosos coros de louvores, o autor dá relevantes contributos à crítica saramagueana, quando, por exemplo, estuda a recepção de romances como o Memorial do Convento ou Levantado do Chão; ou quando traça um balanço crítico da escrita diarística dos Cadernos de Lanzarote. Interessantes ainda as suas considerações sobre o Saramago como crítico da Seara Nova (1967-68); ou ainda sobre a decisiva revalorização do escritor no início dos anos 80.
[MARTINS, Cândido. Notas de apresentação. In: Letras & Letras, 2000]