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Pesadelo

Há um terror de mãos na madrugada,
Um rangido de porta, uma suspeita,
Um grito perfurante como espada,
Um olho exorbitado que me espreita.
Há um fragor de fim e derrocada,
Uma criança que chora sufocada,
Um juramento que ninguém aceita,
Uma esquina que salta de emboscada,
Um risco negro, um braço que rejeita,
Um resto de comida mastigada,
Uma mulher espancada que se deita.

Nove círculos de inferno teve o sonho,
Dozer provas mortais para vencer,
Mas nasce o dia, e o dia recomponho:
Tinha de ser, amor, tinha de ser.



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SARAMAGO, José. Os poemas possíveis. 3a. ed. Lisboa: Caminho, 1981.