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O mexicano Fuentes louva Prêmio Nobel de Saramago


A aclamação da literatura e da intervenção social de José Saramago


Um dos mais famosos novelistas do México aclamou, na quinta-feira, o recente laureado português com o Nobel da Literatura, José Saramago, louvando as suas proezas literárias e a sua coragem em intervenção social.

Carlos Fuentes relembrou o modo como Saramago desencadeou as hostilidades oficiais contra visitantes estrangeiros, no perturbado estado mexicano de Chiapas no início do ano, visitando a região para protestar contra o massacre de camponeses indígenas. Elogiou a coragem de Saramago por fazer a visita a Chiapas, um estado onde a violência é constante desde que a guerrilha Zapatista se insurgiu contra o governo mexicano em 1994, para exigir mais direitos para os índios.

«Talvez Saramago merecesse dois prêmios desta vez. Um prêmio Nobel da Literatura e outro pela Paz», disse Fuentes.

Saramago, com 76 anos, guardou algum tempo, durante uma viagem de conferências ao México em Março, para viajar para Acteal, uma vila onde os paramilitares haviam abatido 45 refugiados índios, a 22 de Dezembro de 1997.

«Ele veio dizer que atrocidades como esta não podem acontecer, não se podem repetir, não podem ser esquecidas e precisam de testemunhas», acrescentou Fuentes, antigo diplomata.

Autoridades mexicanas acusaram turistas estrangeiros e observadores dos direitos humanos em Chiapas de intervenção política e expulsaram dúzias deles enquanto a região estava no centro da atenção dos media, nos meses que se seguiram ao massacre de Acteal.

A identificação de Saramago com a tradição latino-americana de escritores com o papel de interlocutores sociais, também o levou a fazer o prefácio de um documentário fotográfico sobre o Movimento dos Sem Terra brasileiro, Terra, de Sebastião Salgado.

Entretanto, por todo o mundo, oradores portugueses aplaudiram Saramago como o primeiro laureado com um Nobel na sua língua, e Fuentes disse que isto mostrava, mais uma vez, que as notícias da morte do romance são prematuras, pois esta forma literária continua a desbravar novos terrenos geográficos.

«A escrita de Saramago, desde O Ano da Morte de Ricardo Reis até Ensaio sobre a Cegueira, é prova constante da vitalidade do romance moderno, independentemente da língua, nacionalidade, ou do que se pensa», disse Fuentes.

O Ano da Morte de Ricardo Reis é um dos marcos literários de Saramago, um romance surreal, publicado em 1984, cuja ação se passa em 1936 no meio do nascimento do fascismo em Portugal.


Martin Roberts. Bangkok Post, 10 de Outubro de 1998